ATIVIDADES FÍSICAS ADAPTADAS AO DEFICIENTE VISUAL
POR ANTONIO JOÃO MENESCAL CONDE*
Este trabalho tem como objetivo levantar uma caracterização básica das defasagens geralmente apresentadas no desenvolvimento geral de crianças cegas congênitas, antes da primeira intervenção da educação formal, quando comparadas às crianças de visão normal da mesma faixa etária, e, baseado nessa caracteriza- ção, buscar a apresentação da função da educação física adaptada a essa clientela, referenciando sua oportunidade, propriedade e validade como elemento importante e imprescindível no processo educacional pelo qual passará a criança cega. Essa criança geralmente apresenta desempenhos inferiores nas áreas motora, cognitiva e social-afetiva. A defasagem apresentada não é inerente a condição de cego, mas sim função de um relacionamento familiar inadequado e, principalmente, é causado pela própria problemática da realização motora. Quanto menos a criança cega interage fisicamente no ambiente, menos ela experimenta situações de aprendizagem, menos oportunidades ela tem de formar conceitos básicos, menos ela relaciona-se com o ambiente e com as pessoas e mais ela se fecha dentro do "SEU MUNDO" particular e restrito pela falta de informações visuais.
A família, muitas vezes, cria ao redor da criança cega uma redoma formada pela superproteção, que é causada pelo sentimento de culpa, pela desestruturação que o nascimento de uma criança deficiente causa em sua família, pelo medo e por falte de informações. Existe um total cerceamento dá ação motora dessa criança. Tudo vem a ela sem que ela saiba a origem das coisas, tudo aquilo que acontece a seu redor passa-se como situações abaixo do seu limiar de captação o elaboração, fazendo com que ela tenha a tendência de fechar-se cada vez mais em seu mundo exclusivo, não fazendo a relação do seu EU com os que a cercam e com o ambiente em que vive.
As defasagens no desenvolvimento geral da criança cega, que se apresentam como estatisticamente relevantes, são mais acentuados na área rnotora. Estas se dão, não por um déficit análomo-fisiológico inerente à criança congenitamente cega, mas sim pela limitação de experiências rnotoras em diversos níveis.
Corno caracterização do estágio de desenvolvimento motor da criança cega apresentam-se com freqüência as seguintes defasagens: equilíbrio falho, mobilidade prejudicada, esquema corporal e cinestósico não internalizados, locomoção dependente, postura defeituosa, expressão corporal e facial muito raras, coordenação motora bastante prejudicada, lateralidade e direcionalidade não estabelecidas, inibição voluntária não controlada, falta de resistência física, tônus muscular inadequado e falta de auto-iniciativa para ação motora.
Como respostas sociais-afetivas apresentam-se freqüentemente o medo de situações e ambientes não conhecidos, in- segurança em relação as suas possibilidades de ação física, dependência, apatia, isolamento social, desinteresse pela ação motora, sentimento de menos valia, auto- confiança bastante prejudicada e dificuldade no estabelecimento de relações básicas do seu "EU" com as pessoas e com o ambiente.
A limitação na captação de estímulos, assim como a falta de relação objeto visualmente percebido-palavra e a falta de experiências práticas, causam urna defasagem a nível cognitivo, que tem corno característica básica a dificuldade na forma- ção e utilização de conceitos. Ressalve-se que a defasagem cognitiva é uma situação conjuntural e não estrutural no desenvolvimento da pessoa cega.
Privado do principal dos sentidos a criança cega não desenvolve naturalmente os sentidos intactos de forma compensatória. O tato, as cinestesias, a audição e o olfato, sem uma adequada estimulação, não atuam de maneira fidedigna na diminuição na defasagem na captação e elaboração dos estímulos que a cegueira provo- ca. Além disso, a impossibilidade da imita- ção e do estabelecimento de modelos restringe, ainda mais, a facilitação de seu desenvolvimento.
A educação física adaptada à criança cega trabalha abrangendo o seu desenvolvimento, não só na área psicomotor,, como também os aspectos cognitivos, sociais-afetivos e sensoriais. Ela utiliza o corpo da criança cega como instrumento, como ferramenta mor. Partindo do conhecimento e domínio deste corpo, ela usa o movimento controlado como meio, o res- peito absoluto a individualidade do aluno como estratégia básica, o prazer da des- coberta de poder fazer como reforço, tendo como fins o alicerçamento e a potencialidade de seu desenvolvimento geral, bus- cando propiciar condições favoráveis à sua trajetória acadêmica e, futuramente, à sua emancipação social.
A criança cega tem absoluta necessidade de descobrir, conhecer, dominar e relacionar o seu corpo com o ambiente e com as pessoas. Só assim ela se identificará como ser inédito, formando o seu "EU", interagindo no ambiente e em seu grupo social, é uma etapa de seu desenvolvimento que não pode ser queimada. Dela vai depender todo o caminhar de sua matura,@ção. Ela buscará inicialmente a própria estimulação dentro do âmbito corporal encontrado aí o desestírnulo e a motivação para a ação motora.
O conhecimento do próprio. corpo está intimamente vinculado ao desenvolvimento geral da criança cega. Ao levá-la, como primeiro passo, ao conhecimento, controle e domínio do seu corpo, a educação física adaptada irá embasar e favorecer a evolução dessa criança, enfocando também aspectos como a auto-confiança, o sentimento de mais valia, o sentido de cooperação, o prazer de poder fazer e as interfaces dessas valências afetivas com o seu cotidiano na família, na escola e na sociedade, a educação física cumprirá sua função de importante elemento facilitador no caminhar da criança cega rumo à sua emancipação social, possibilitando-lhe condições básicas que capacitem-na futuramente a superar as barreiras, de diversos tipos, nuances e intensidades, que certamente lhe serão impostas.
* ANTÔNIO JOÃO MENESCAL CONDE - Professor de Educação Física do instituto Benjamin Constant. Fone: (0XX21) 295-4499 email: ibc@infolink.gov.br